Subida record do preço da habitação: vencedores e perdedores

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Subida record do preço da habitação: vencedores e perdedores

Last Updated on 3 Outubro 2025 by Equipo Urbanitae

Com o regresso do verão, o preço da habitação em Espanha continua a registar uma subida recorde, refletindo uma realidade social complexa que não parece ter solução a curto prazo.
Os dados mais recentes confirmam-no. Segundo o portal especializado Fotocasa, o preço médio de uma habitação usada em Espanha foi de 2.738 €/m2 em agosto de 2025. Comparando com os últimos 5 anos, isto representa um crescimento de 45%, especialmente nas grandes cidades e áreas metropolitanas, onde a oferta continua incapaz de absorver uma procura desenfreada, tornando a aquisição de uma habitação a preço acessível numa missão impossível para grande parte dos cidadãos.

Javier Santacruz, economista, analista financeiro e professor universitário, explica que “temos um sério problema de oferta. Há muito poucos licenciamentos de obra nova face à procura potencial, o que mantém a pressão sobre o mercado de segunda mão. Saem apenas entre 120.000 e 130.000 novas habitações, quando para estabilizar a situação precisaríamos de, pelo menos, 1 milhão. Algo completamente inexplicável num país como Espanha, onde existe solo suficiente suscetível de ser urbanizado”.

Vários problemas convergiram ao mesmo tempo para que esta situação se tornasse um problema nacional: a essa falta de habitação nova soma-se um maior poder do investimento estrangeiro que, juntamente com a ausência de políticas eficazes, tornaram o acesso à habitação cada vez menos acessível para os espanhóis. Ao mesmo tempo, a procura internacional, sobretudo em cidades turísticas e com atratividade económica, intensifica a pressão sobre os preços. Como consequência, o défice habitacional continua a crescer e ameaça tornar-se crónico sem políticas decididas.

Esta situação, que exige a implementação de um plano de reformas estruturais, tem um beneficiário claro: as administrações regionais. As Comunidades Autónomas veem engordar os seus cofres graças à cobrança de dois impostos-chave na compra e venda: o Imposto de Transmissões Patrimoniais (ITP) e o de Actos Jurídicos Documentados (AJD). O primeiro incide sobre a compra de habitações usadas, enquanto o segundo se aplica sobre escrituras e documentos notariais durante o processo. Ambos os impostos estão cedidos às autonomias, de modo que cada aumento no preço de venda tem um impacto proporcional na receita fiscal da região em causa, produzindo uma situação paradoxal: num momento em que os cidadãos são obrigados a destinar cada vez mais parte dos seus rendimentos à habitação, os governos regionais recebem um benefício económico direto.

Santacruz explica que “a escalada de preços aumentou substancialmente a receita por ITP/AJD das CC.AA., o que reforçou a sua disponibilidade orçamental. Este aumento de receitas melhora a capacidade financeira das comunidades a curto prazo e poderia facilitar despesa social ou investimento em habitação. No entanto, trata-se de uma receita volátil: sobe muito quando o mercado sobe e cai em fases de travagem”. Na prática, quando a receita aumenta, algumas comunidades optam por destinar parte a despesa corrente ou bonificações fiscais; outras orientam-na para políticas de habitação (compra de solo, promoção pública, apoios).

A comparação entre o número de transações e o crescimento da receita evidencia esta situação. Embora nos últimos trimestres as transações tenham mostrado sinais de estagnação, e até algum retrocesso, as receitas por ITP e AJD continuam a crescer porque as operações, mesmo sendo menos numerosas, se fecham a preços mais elevados. Este contraste revela um sistema fiscal que não se ajusta à realidade social, já que o maior rendimento destes impostos não se traduz numa maior atividade económica no setor.

O impacto social é evidente, sobretudo entre os jovens. A taxa de emancipação em Espanha mal supera os 15%, segundo a última edição do Observatório de Emancipação do Conselho da Juventude de Espanha, uma das mais baixas da Europa. O mesmo relatório mostra que há 10 anos era de 20%. Os salários médios, estagnados há anos, não acompanham o custo de compra ou arrendamento, obrigando a destinar uma percentagem cada vez maior dos rendimentos à habitação. Uma brecha que tornou a emancipação algo ao alcance de poucos.

A necessidade de implementar reformas estruturais

Perante este cenário, torna-se cada vez mais urgente abrir um debate sério que procure encontrar soluções reais. Uma das mais apontadas é o impulso ao arrendamento social, que permitiria aumentar o parque público de habitação a preços acessíveis, como acontece noutros países europeus, onde atinge percentagens muito superiores. Coloca-se também a necessidade de mobilizar as habitações vagas, através de incentivos ou impostos que permitam incorporar no mercado parte dos milhões de imóveis atualmente desocupados em Espanha. A isto junta-se a revisão da fiscalidade, para que impostos como o ITP e o AJD não atuem como barreira adicional ao acesso à habitação, e o desenho de políticas urbanísticas que promovam a construção de habitação e a colaboração público-privada com o objetivo de garantir a acessibilidade. Javier Santacruz aponta para a necessidade de “uma reforma urgente da Lei de Arrendamentos Urbanos, em coordenação com as competências das CC.AA., para provocar uma entrada massiva de habitações no mercado de arrendamento com todas as garantias jurídicas de proteção da propriedade”. Uma medida que provocaria uma descida automática dos preços. Além disso, o especialista propõe a criação de uma “regulação única de licenças que harmonize as competências regionais e nacionais para promover obra nova e reabilitação, assim como um pacto entre todos os agentes implicados para promover uma Lei do Solo que estabeleça estritamente onde é proibido construir, o que colocaria em marcha um movimento de obra nova em terrenos onde sim fosse permitido, em zonas de forte procura”.

O desafio consiste em alcançar um modelo que assegure, de facto, o direito constitucional a uma habitação condigna para as gerações presentes e futuras.

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diego.gallego@urbanitae.com

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