
A periferia urbana, novo destino para investir em habitação
O setor imobiliário em Espanha vive um momento de viragem, em que as rendibilidades em máximos convivem com um mercado cada vez mais inacessível, devido, entre outros fatores, à falta de habitação nova, bem como à perda de poder de compra de grande parte da população. Neste contexto, estão a verificar-se várias mudanças paradigmáticas no investimento imobiliário, entre as quais a importância da localização do imóvel. Se antes a localização definia a rendibilidade, agora a escassez da oferta levou a procurar novas zonas para adquirir habitação, transformando a periferia das cidades num novo atrativo.
Assim o conclui a Autoridade Tributária num dos seus últimos relatórios, Estatística dos declarantes de IRS, referente ao ano de 2023, onde se assinala que a rendibilidade bruta é hoje claramente mais elevada na periferia do que no centro das cidades, ao contrário do que era habitual anteriormente.
Em que ponto se encontra a habitação como investimento?
A habitação atravessa em 2025 uma fase de crescente complexidade: continua a ser considerada um ativo refúgio a longo prazo, mas é cada vez mais difícil encontrar boas oportunidades. A situação nas grandes cidades torna-se mais complicada: a falta de oferta levou muitas comunidades autónomas a declarar zonas tensionadas, obrigando à formulação de uma nova Lei da Habitação que prevê benefícios fiscais para os senhorios e limita os preços do arrendamento em áreas onde estes dispararam. Recentemente, Galiza, País Basco e Navarra acrescentaram novos municípios a esta lista, elevando para 301 as cidades ou vilas declaradas zonas tensionadas desde o início do ano. Enquanto nestas cidades as oportunidades se comprimem, nas zonas emergentes disparam.
Durante anos, o mecanismo de rendibilidade para o investidor imobiliário era claro: quanto melhor a zona, maior o rendimento. Ou seja, as habitações no centro das cidades são mais caras e, em consequência, deveriam ser mais rentáveis. Mas nem tudo o que reluz é ouro: se, por um lado, existe uma procura estrutural constante, por outro, os preços de acesso são elevados e a carga fiscal é maior. Já as zonas periféricas são mais acessíveis, apresentam menos dificuldades de entrada e registam uma procura crescente.
O que nos dizem os dados do IRS
No relatório recentemente publicado pela Autoridade Tributária conclui-se que a periferia oferece maior rendibilidade bruta. A explicação reside no preço de aquisição: embora as rendas sejam mais baixas, o custo de compra é incomparavelmente mais acessível nas periferias do que no centro das cidades, o que explica margens de lucro mais amplas. Além disso, esta tendência não é exclusiva das grandes cidades, mas está disseminada por todo o território nacional.
De facto, os municípios com mais de 20.000 habitantes com maior rendibilidade do arrendamento encontram-se todos na Comunidade Valenciana: Elda (8,9%), Novelda (8,9%) e Alcoy (8,7%). O mesmo se verifica em grandes cidades como Barcelona ou Madrid. Nesta última, a rendibilidade é mais elevada na periferia: Parla (7,3%), Ciempozuelos (6,4%) e Collado Villalba (6,4%) lideram o ranking da capital. Na Andaluzia, a situação não é diferente: em Sevilha, os municípios mais rentáveis são San Juan de Aznalfarache (8,2%), Camas (7,2%) e Carmona (6,3%).
Quais são as causas deste fenómeno?
Este “deslocamento” das tendências de investimento e rendibilidade do centro urbano para a periferia deve-se a várias causas económicas e sociais. A pandemia trouxe mudanças culturais que tiveram impacto direto no mercado imobiliário. Por exemplo, a flexibilidade laboral aumentou significativamente e muitas empresas já não exigem que os trabalhadores estejam no escritório todos os dias da semana. Este crescimento do teletrabalho facilita a saída do centro das cidades e amplia a procura em áreas secundárias onde a qualidade de vida pode ser melhor a um custo mais baixo.
Há também, naturalmente, fatores económicos. O aumento do preço dos terrenos em zonas centrais reduziu a sua atratividade, tanto em termos de arrendamento como de retorno para o investidor. Em 2024, o preço por metro quadrado aumentou 8,4%, enquanto os salários cresceram apenas 3%, como mostra o estudo Relação entre salários e compra de habitação em 2024, publicado pela Infojobs e pela Fotocasa.
Neste sentido, uma fatia cada vez maior dos salários é destinada ao arrendamento: segundo o Idealista, em média, em Espanha, 38% do rendimento é gasto na renda da casa, percentagem que em Málaga sobe para 55%. Esta pressão está diretamente relacionada com o aumento da oferta na periferia, onde surgem novas zonas residenciais que funcionam como válvula de escape para um mercado sob pressão.
Esta tendência vai continuar?
Tudo indica que não se trata de um fenómeno passageiro, mas que, observando as tendências demográficas, é provável que se intensifique nos próximos anos. Se olharmos para Madrid, em 2024, pela primeira vez, mais de metade dos residentes da comunidade não vivia na cidade (51%), segundo o INE. Um dado significativo que mostra como poderá ser a expansão urbana a médio prazo.
Para os investidores imobiliários, esta nova dinâmica pode ser uma oportunidade de diversificar os seus ativos fora dos centros urbanos, porque os dados são claros: os bairros periféricos e as cidades-dormitório são hoje muito mais rentáveis.